sexta-feira, 5 de outubro de 2012

BOLA AO MEIO: Análise Benfica-Barcelona




Casa cheia para ver mais um duelo frenético da Liga dos Campeões. De um lado, o Benfica, campeão europeu em 1960/1961 e 1961/1962. Do outro, o Barcelona, campeão em 1991/1992, 2005/2006, 2008/2009 e 2010/2011. Barcelona de Guardiola e agora Tito Vilanova.


Dois marcos da história do futebol distanciados por 50 anos. As equipas de hoje têm um protagonista em comum, Cruyff. As ideias do holandês são a base dos princípios utilizados pelo Benfica e Barcelona. A luta permanente pela procura da posse de bola, pressing ofensivo, futebol apoiado, controlo de tempos e espaços são algumas das características comuns entre as duas equipas. 


Jorge Jesus montou bem a estratégia para tentar parar o Barcelona. Blocos juntos, solidariedade defensiva, ocupação das zonas e transições rápidas são alguns dos conceitos que associamos ao Benfica de terça-feira. O técnico português surpreendeu tudo e todos ao colocar Gaitán, Bruno César e Salvio no apoio a Lima. Percebeu-se a não inclusão de Aimar, o argentino joga mais em ataque continuado e com posse de bola, algo que o Benfica teve (muito) pouco (24%). Bruno César consegue recuperar mais rapidamente posição e ocupar melhor zonas defensivas que Martins e Aimar, daí a escolha ter recaído no brasileiro. A ideia passaria por segurar o jogo até ao intervalo e depois sim lançar Martins e Aimar para tentarem aproveitar a desorganização defensiva do Barcelona fruto do balanceamento ofensivo. Bruno, Enzo e Matic correram muito mas lutaram pouco, até porque não se tratam de jogadores com características muito defensivas com excepção feita para o sérvio que foi dos melhores jogadores em campo, destruiu como ninguém e construiu como nunca devido à liberdade que tinha. Lima, Gaitán e Salvio foram lançados para levar para o campo imprevisibilidade e velocidade. Mas foi precisamente do lado contrário que surgiram estas características com Messi a aproveitar uma das poucas desconcentrações defensivas do Benfica durante os 90 minutos e a arrancar pela esquerda para assistir Alexis Sanchez que fez o 1-0 aos 6 minutos. O 2-0 ocorre numa situação em que Messi (mais uma vez) recua para ir ao encontro da bola e arranca de frente para a baliza arrastando consigo a defensiva encarnada para depois assistir Fàbregas aos 55 minutos.


O golo madrugador caducou todas as esperanças benfiquistas e alterou tudo aquilo que Jesus tinha idealizado antes do início da partida. O Benfica teve de se libertar mais e chegou a penetrar algumas vezes a área culé mas sem êxito, muito por mérito de Valdés que no final do jogo confessou que nunca uma equipa tinha chegado tantas vezes à sua baliza, simpatia ou não, a verdade é que o Benfica chegou mesmo a criar mais oportunidades que o Barcelona.

No final do jogo, Jorge Jesus assumiu que a equipa podia ter feito mais pressão no portador da bola e não ter recuado tanto no terreno, algo que possibilitou a que os jogadores do Barcelona tivessem mais tempo para pensar e executar algo que lhes facilitou e muito a vida. De um total de 896 passes feitos, 773 tiveram o destino certo, ou seja, 86% corresponde à percentagem de acerto de passes por parte do Barcelona. Tal só é possível numa equipa com estas características tão invulgares como é o Barcelona dos dias de hoje. Sendo que o jogador com maior percentagem de passes certos foi Busquets com 95%, onde em 110 passes apenas falhou 6. Song teve uma percentagem de 100% mas com números muito mais reduzidos, 15 passes feitos. Isto é fruto de uma filosofia de jogo que é incutida desde as camadas jovens mas também é aliado ao facto de se tratar de jogadores com grande qualidade técnica e ainda pelo situação referida anteriormente, onde o Benfica não exerceu uma grande pressão ofensiva, preferindo baixar os blocos e esperar pelo Barcelona no seu meio-campo defensivo para depois fazer transições rápidas através dos extremos argentinos.

Estes números diferem e muito quando falamos do caso do Benfica, onde em 306 passes feitos, apenas 176 foram certeiros, o que corresponde a 58% de eficácia. Não se trata de falta de qualidade técnica por parte dos jogadores encarnados, antes pelo contrário, trata-se sim da abordagem do Barcelona, que passa por não deixar os seus adversários terem bola e controlarem o jogo. O Benfica correu desde muito cedo atrás da bola e isso verifica-se quando olhamos para a distância percorrida onde o Benfica correu cerca de 115km e o Barcelona 108km o que é ainda uma grande diferença e demonstra o controlo e domínio espanhol.

É certo que depois do jogo, é mais fácil falar como fez Jorge Jesus ao dizer que tinha pedido aos jogadores mais agressividade sobre a bola mas se assim fosse, 3 substituições não seriam suficientes para rodar a equipa. É um tremendo esforço físico para qualquer jogador do Benfica que não está habituado a correr atrás da bola mas sim a jogar com bola. É igualmente certo, que Mourinho já tinha tentado adoptar uma postura idêntica ao que o Benfica adoptou no jogo de terça e acabou por perder 5-0 num desses jogos. O Real passou a ser visto com outros olhos e a conseguir disputar os jogos com o Barcelona quando deixou de adoptar uma postura tão defensiva e decidiu jogar igual a si mesmo, com verticalidade, transições rápidas e objectividade mas sem que para isso tenha de descer os blocos até ao meio-campo e limite-se a defender e a contra-atacar. As equipas que jogam demasiado defensivas frente ao Barcelona em busca de contra-ataques acabam por ser penalizadas e perdem mesmo os jogos. Jesus errou nesta abordagem embora tenha montado bem a estratégia da equipa, a verdade é que são escassas as opções para o meio-campo e nesse sentido, o técnico português vê-se obrigado a inventar soluções, algo que contra o Barcelona é impensável, era necessário mais músculo, agressividade, sentido posicional e índices de desarme no meio-campo benfiquista para contrariar a tendência ofensiva blaugrana. 

Para além disto tudo, faltou também eficácia ao Benfica que conseguiu penetrar as zonas defensivas do Barcelona mas sem grande resultado. As poucas desconcentrações defensivas por parte do Benfica resultaram em golos do Barcelona mas o contrário não se verificou e esta foi uma das várias diferenças entre as duas equipas. Barcelona controlou e dominou toda a partida contra um Benfica muito preocupado a nível defensivo e sem grandes argumentos em termos ofensivos. Jesus terá de reponderar a estratégia frente ao Barcelona se ambiciona algo mais, é certo que falamos de uma das melhores equipas do Mundo mas é imperativo que o Benfica faça algo mais e não ter uma postura tão passiva. Falta muito para a passagem aos oitavos-de-final mas para o Benfica marcar presença entre os melhores terá de superar o Celtic e o Spartak, já que estas equipas também terão uma tarefa complicada frente ao Barcelona.

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